FB_init

Monday, July 13, 2009

Seguindo Jesus na Cultura: igreja emergente como movimento social

Seguindo Jesus na Cultura: igreja emergente como movimento social

Por Ryan Bolger

Tradução de Gustavo K-fé Frederico

Capítulo 11 do livro “An Emergent Manifesto of Hope”. Doug Pagitt, Tony Jones (ed)
ISBN 978-0-8010-6807-2, Baker Books

Tradução publicada originalmente em http://gustavofrederico.blogspot.com

Deus criou culturas para comandar o mundo, e em última instância é Cristo quem une essas culturas. Culturas são decaídas – elas deveriam servir e libertar mas ao invés elas tornaram-se opressoras. Essas práticas culturais levaram a humanidade a praticar idolatria através da dominação e medo. No entanto, porque essas culturas são criação de Deus não falta a elas esperança.

Jesus não rejeitou a cultura; é onde ele começou com pessoas. Ele dialogou envolvendo-as e falou a língua delas. Não que Jesus tenha sido contra-cultural, mas ele foi [um] inconformado na cultura. Como um membro da cultura, ele encarnou a mensagem de vida naqueles lugares onde a cultura advogava morte. Jesus viveu em duas dimensões simultaneamente – ao mesmo tempo dentro da cultura humana e submisso ao reinado de Deus.

As culturas influenciam a prática da religião em uma dada sociedade. Frequentemente é muito difícil de as pessoas saberem as tendências das suas próprias culturas, tanto em termos de seu lugar na História (por exemplo, modernidade ou pós-modernidade) como também em termos de seu relacionamento com os poderes do mundo (por exemplo, como um império ou uma colônia). Por mais difícil que seja, é especialmente útil para seguidores de Jesus conhecer os aspectos tóxicos das suas culturas de forma que eles possam propôr alternativas onde for apropriado.

Ao longo da história a igreja assumiu as formas e estruturas da sua cultura ao redor. Não devemos lamentar isso – as igrejas devem representar culturalmente as próprias pessoas que formam suas comunidades. No entanto, cada cultura e toda cultura é decaída, e portanto, se uma igreja local deseja encarnar o reino de Deus, ela deve ouvir e permitir que esse mesmo reino faça crítica.

Além do retorno do reino, a igreja deve ouvir a cultura também. A igreja várias vezes cria sua própria sub-cultura, separada do reino e separada da cultura ao redor. Para que a igreja realmente sirva de “uma cidade na colina” para aqueles de fora, ela deve interagir dinamicamente com a cultura ao redor de formas que façam sentido para aqueles de fora. Em suma, a igreja local deve ouvir a ambos o reino e a cultura se ela for levar o modelo de Jesus de missão a sério.

A Igreja na Cultura Ocidental Hoje

Várias subculturas no Ocidente hoje são holísticas. Elas vêem conexões entre artes, espiritualidade, economia e política. Elas constroem seu mundo em teias e redes – não simplesmente de forma linear. Elas criam suas formas de vida em torno de imagens ao invés da palavra escrita. Assim como com todas as culturas, essas mudanças representam dinâmicas tanto vitais como destrutivas.

A igreja, se quiser ser ouvida, deve falar politica, espiritual e artisticamente, usando imagens e atividades como seu meio principal de comunicação. A igreja não deve ser ingênua – o meio é realmente a mensagem. Enquanto comunica através dessas formas, a igreja deve oferecer aceitação e crítica a ambos os meio e mensagens contidos. Embora Deus tenha criado as culturas para comandar a criação, porque estas são decaídas devem ser transformadas.

A Missão de Deus

Antes da pregação de Jesus do reino e da existência da igreja há a missão de Deus. Deus demonstrou sua missão no Israel antigo, em Jesus, na igreja primitiva, e nos vários momentos na história da igreja. Essas não foram missões alternativas mas várias instâncias da única missão de Deus: restaurar a criação. A igreja hoje é uma receptora da missão antes mesmo de ser um agente de missão. A missão de Deus é aberta a todos que desejarem participar com Deus. Hoje as igrejas não precisam descobrir sua missão particular; ao invés, elas devem encontrar a missão de Deus, apoiá-la, e executá-la. A igreja não precisa se debater com o que a missão de Deus é no mundo – ainda hoje, a missão de Deus se parece com o trabalho que Jesus fez dentro da cultura Palestina.

Em Jesus nós vemos a missão de Deus tornar-se carne. No Pentecostes o Espírito Santo outorgou poder à igreja para continuar o trabalho de Jesus no mundo. Assim como Jesus foi enviado a Israel, assim também a igreja é enviada a todas as outras culturas. O Espírito Santo lidera e sustenta a igreja para que incorpore o evangelho em todos os contextos, até o final dos tempos.

Uma igreja com semelhança de reino segue a missão de Deus entrando no mundo porque é ali que a missão de Deus está localizada. Tal igreja não precisa buscar criar uma estrutura do tipo “venham-a-nós” e convencer outros a tornarem-se membros – o reino de Deus é muito maior do que as listas de membresia de igrejas locais.

Aqueles que seguem o reino de Deus encarnam as Boas Notícias entre aqueles a quem conhecem – seja nos seus lugares de trabalho, seus clubes de crianças, seus bairros, e até suas comunidades de fé. Eles vivem com o entendimento que primariamente o evangelho aborda como viver a vida – não somente o destino eterno de alguém. A igreja tem a oportunidade de participar com Deus na redenção do mundo. É através das próprias vidas das pessoas que o evangelho torna-se real.

Movimentos do Reino de Deus

Jesus criou um movimento contra-templo[1] cheio de perspectivas alternativas do Torá. Ele desafiou aquelas atividades de fora, exerceu crítica, e modelou um caminho diferente. Mesmo permanecendo dentro da macro-cultura do Judaísmo nos seus dias, Jesus criou alternativas às práticas do templo com características de reino que se opunham ao reino de Deus, tais como o sacerdócio, o templo, e a monarquia.

Movimentos de renovação acontecem fora dos centros de poder institucional, várias vezes em expressões orgânicas nas periferias. Jesus e João batizaram seus seguidores iniciando-os em um movimento, em um caminho alternativo de ser o povo de Deus. Os Israelitas que vinham ao rio Jordão se arrependiam da forma em que eles entendiam sua fé e se preparavam para uma nova forma. Eles ouviram a mensagem de que o reino de Deus estava perto, foram batizados e se juntaram a um movimento dentro das estruturas religiosas daquele tempo.

Movimentos com características de reino providenciam um contraste com todos outros poderes, até mesmo religiosos. Eles não focam em apenas um só problema; ao invés, eles oferecem um contraste a todos os aspectos da vida – na cultura, na economia, e dentro de estruturas sociais e políticas. Quando Cristãos vivem uma lógica alternativa dentro desses poderes, eles começam a transformar esses mesmo poderes.

Movimentos com características de reino desmascaram os poderes ao nomeá-los e ao viverem um caminho diferente dentro deles.Eles demonstram que os poderes não são a autoridade suprema. Por causa do reino de Deus, esses poderes não podem mais dominar.

Abaixo eu exploro cinco características desses movimentos com características divinas.

Um Movimento Comunitário

Toda atividade que Jesus fez foi em um contexto sócio-político. Jesus poderia simplesmente ter procurado transformar a sociedade no nível macro, mas ao invés ele criou uma micro-sociedade para transformar a cultura. Essa comunidade que funcionava 24 horas a semana inteira se relacionava a tudo na vida. Como um novo tipo de família, eles praticaram política, economia e estrutura social alternativas. O Sermão do Monte serviu como sua constituição.

A principal tarefa de igrejas com características do reino é capacitar aqueles dentro da comunidade a servir debaixo do reinado de Deus. Ao incorporar este reino, a formação da comunidade deve ser central e envolve treinamento prático no evangelho: como servir, como perdoar, como amar, como abrir a sua casa para hospedar. Mais importante do que qualquer programa, a formação comunitária fornece uma maneira de a pessoa viver uma forma de vida completamente diferente.

Hoje os que procuram começar novas igrejas devem sempre fazer perguntas do reino. Uma igreja local é só mais uma instituição social qualquer – não há garantia que ela reflita o reino de Deus. Apenas quando a comunidade local segue o reinado de Deus – tanto na sua vida como uma micro-sociedade como no seu testemunho na cultura em geral – ela serve para refletir o reino de Deus.

Um Movimento de Reconciliação

Jesus transforma a noção de revolucionário. Embora ele pudesse ter sido chamado de revolucionário, ele advogou amor em vez de guerra. Seus seguidores teriam-no seguido em uma inssurreição violenta, mas Jesus preferiu não perpetuar a agressão da cultura como um todo. Ele estimulou suas comunidades a não ter inimigos a não ser Satanás e a abandonarem todas os juramentos nacionais. Seu movimento era muito mais diferente dos movimentos revolucionários que antecederam. Ele não advogou ódio aos “grupos de fora”. Ao contrário, ele agrupou os de fora juntos.

A igreja, por sua vez, deve envolver todas as pessoas que se submetem ao governo de Deus, criando um novo tipo de pessoas. Elas devem modelar uma forma diferente de interação humana entre partes desiguais. A nova ordem da igreja é de reconciliação, com raças, idades, etnias, sexos e classes diferentes se unindo.

Membros da igreja devem trazer “os de fora” para dentro da comunidade ou eles não vão aprender as habilidades de reconciliação. A vida comunitária da igreja ajuda suas pessoas a superar seu racismo e sua suspeita daqueles que são diferentes e ensina-os como perdoar. Dentro da comunidade de fé, pessoas superam seus ódios de forma que amar torna-se uma possibilidade real no seu testemunho.

Comunidades com características de reino ajudam a curar divisões na cultura também. Esses fiéis servem como advogados e guias. Eles demonstram uma vida de inclusão, perdão, reconciliação, e não-violência, e eles convidam o mundo a vir à igreja para aprender essas habilidades também.

Um Movimento de Hospitabilidade

Jesus anunciou que os pobres seriam libertos, que teriam o suficiente, e que seriam incluídos na mesa do banquete. Jesus anunciou o Jubileu, um tempo em que o compartilhar levaria a uma abundância, e ele declarou que o tempo de fome havia acabado.

Proclamando a remissão das dívidas, Jesus chama seus seguidores a serem agentes de generosidade. Hoje a igreja encontra-se no contexto de capitalismo consumista, uma cultura onde trocas de interesse próprio alimentam um desejo insaciável. O desafio da igreja é transformar essas trocas em relacionamentos do tipo “Jubileu” de uma economia de presente. Talvez agora “libertação aos cativos” fale àquele preso ao ciclo interminável de desejo de consumo. A igreja que repreende os poderes de consumo pode responder consumindo menos – por exemplo, ao minimizar o tempo dirigindo carros, planos de carreira profissionais, ativismo, o comer fast-food, ou o comprar roupas feitas em fábricas exploradoras.

A igreja se depara com o desafio de como viver em uma economia de consumo enquanto vira as regras de cabeça para baixo – de forma que os pobres vençam. A igreja deve criar práticas que libertem aqueles oprimidos pelo capitalismo consumista, enquanto ratifica e apóia as práticas na economia capitalista que oferecem alívio ao pobre, ao excluído, e ao meio-ambiente. Viver dessa maneira oferece um contraste com o desejo sem limite.

Como partes do testemunho da igreja com características do reino, as pessoas vão extender suas vidas familiares aos de fora, compartilhando aquilo que elas têm com outros. Suas ações no trabalho ou no bairro vão modelar o presente ao invés da troca.

Um Movimento de Liberdade

Jesus criou uma comunidade livre de patriarcado onde ricos e pobres, homens e mulheres, os de dentro e os de fora receberam espaço igual. Jesus tratou aqueles sem status como parceiros iguais. Embora a cultura tenha valorizado relacionamentos patriarcais, Jesus criou uma alternativa a este sistema. Na sua comunidade não há pai, somente mães, irmãos, e irmãs.

Se a igreja hoje for seguir Jesus em relação ao poder, ela deve criar um espaço para o governo de um movimento livre de dominação – uma comunidade de liberdade verdadeira. Ela deve verificar como funcionar recusando exercitar certos tipos de poder, até mesmo para fins legítimos, e recusando praticar a coerção de qualquer tipo, seja física ou psicológica.

Até aqueles com o dom de liderança se submetem ao reino de Deus – uma esfera livre de dominação, achando maneiras de liderar que excluem coerção de qualquer tipo. O mesmo vale para gerentes, empresários, ou líderes missionários, bem como conselheiros, gerentes e técnicos. Se eles criarem sistemas de controle, eles não estarão trabalhando no reino de Deus e suas práticas devem ser transformadas. Em um sistema livre de dominação, o único modo viável de liderança é persuasão através do serviço[2].

Líderes com características de reino criam contextos onde o reino de Deus é abraçado e onde à igreja é concedida autoridade para seguir Jesus para dentro do mundo. Possibilitando esses tempos de discernimento, líderes de igreja ajudam a desenvolver os dons dos menos treinados. Não há diferença em termos de poder entre clero e laicado, pois todos são convidados a tomar as decisões importantes e todos têm poder igual para cumprir seus chamados na comunidade.

Jesus falou contra os abusos de poder no establishment político-religioso. Ele proclamou uma ordem de paz ao invés de uma ordem de dominação. Como Jesus, a igreja deve falar a toda esfera da sociedade para parar dominações – [e] para ouvir os excluídos, os solitários, e os sem voz. Nós podemos ser um modelo àqueles fora da igreja [que mostra] como é quando todos falam e ouvem. No seu testemunho, a igreja denunciará profeticamente todas as tentativas de silenciar ou excluir pessoas da conversa.

A igreja dispersa se recusa a participar controlando outros. As pessoas se recusam a forçar outras através de posição, influência, ou força física. Se a igreja se achar no fundo da pirâmide social, as pessoas vão buscar transformação através da sua subordinação voluntária, nunca procurando agarrar o poder. Se a igreja estiver no topo dessa mesma pirâmide, as pessoas ainda assim vão se recusar a dominar.

Um Movimento de Espiritualidade

Jesus ensinou à comunidade da igreja primitiva a ligar e a desligar, a confrontar e a perdoar. Assim a comunidade é formada nos caminhos de Deus. Igrejas com características de reino oram juntas, confessam seus pecados uns aos outros, cuidam uns dos outros, e animam-se uns aos outros. Às vezes, elas sofrem juntas – às vezes como resultado de serem vários. Uma igreja com características de reino deve ser hábil nas disciplinas de confissão, confronto, e perdão. São essas práticas que marcam essas comunidades como singulares no mundo.

Dentro da cultura a igreja compartilha na crítica profética sobre a morte das práticas espirituais. Discussões sobre espiritualidade desacreditam a secularização, a fragmentação das esferas da vida, e a destruição do meio-ambiente. Séculos atrás a igreja desistiu da crítica secular e aceitou seu papel mínimo na esfera privada, mas a igreja com características de reino abraça esses movimentos da cultura. No entanto, essas igrejas devem exercitar discernimento – a prática da espiritualidade varia grandemente de uma cultura para a outra, especialmente no tocante à religião interiorizada.

Como um movimento, igrejas com características de reino vêem-se como um contraste com as suposições na Cristandade de como religião se parece. Elas notam que os poderes que estão se esgotando da Cristandade determinaram a forma da sua fidelidade. Igrejas com características de reino agora têm que provar que sua fidelidade principal é com o reino de Deus – não com as formas congregacionais americanas de religião.

Culto Resultante

Como as práticas alternativas desse movimento, essa micro-sociedade de reconciliação, generosidade, e liberdade dentro de uma cultura pós-moderna, transformam a prática do culto? Existem certas práticas de culto que podem passar por mudanças como conseqüência do reinado de Deus.

Vencendo vários dos dualismos da modernidade, a liturgia torna-se holística, levando o corpo de volta ao culto enquanto aceita o mistério. Liturgia conecta toda a vida com espiritualidade, vencendo a divisão do sagrado/secular. É a linguagem do povo, então ele falará no idioma comum da espiritualidade, freqüentemente através de imagens. O culto torna-se um lugar onde os membros ganham habilidades de perdoar e serem perdoados.

O culto torna-se um lugar onde divisões de classes são vencidas, e todos os grupos exercem um papel na sua expressão. Não há tratamento preferencial de uma prática cultural sobre outra. O culto demonstra essa nova ordem, essa nova realidade social de todas as pessoas se reunindo para adorar a Deus. Elas ensaiam como são diferentes do mundo através de atos de amor reconciliador. O culto torna dois tipos de pessoa um.

O culto pode ser marcado por uma refeição juntos ou pela partilha econômica. A Eucaristia cria um contexto de abundância, e ajuda econômica é dada àqueles que precisam dela. O próprio culto serve de uma prévia do banquete a vir.

O culto expressa o dom de cada membro, sem um dom ter prioridade sobre outros. O culto compreende uma oferta rica cheia de vários dons, todos igualmente respeitados. Cada um vem para adorar, para criar, participar, compartilhar, e para ser ouvido de formas significativas, e cada um é necessário para discernir onde o Espírito Santo está indo. A liturgia demonstra como os poderes foram retidos e demonstra uma forma diferente de participar do poder, e mostra que a história não é determinada pelos poderosos mas pelo Cordeiro.

Para se parecer com Jesus na Palestina e Paulo no Império Romano, um movimento sob o reinado de Deus deve servir aos poderes políticos dominadores do mundo tanto como um contraste como um agente transformador. Se seguidores de Jesus buscam uma vida com características do reino tanto nas suas comunidades congregacionais como dentro da cultura ao redor, eles devem operar como um movimento que segue a missão de Deus para dentro do mundo. Nesse capítulo nós exploramos umas poucas práticas que comunidades em qualquer contexto praticarão se elas forem realmente encarnar o reino de Deus no seu meio. Espera-se que esta discussão informal possa inspirar outros a darem tais passos. Como tornar-se um movimento social que serve como um sinal do reino de Deus dentro da cultura continua sendo o desafio do tempo presente.



[1] NT: No original: “counter-temple”, não exatamente no sentido de negação, mas sim no sentido de tendência na direção oposta, ou com ordem de direção inversa.

[2] NT: No original: “servanthood”, com a noção de serviço de um empregado, ou serviço de um empregado para um patrão.

No comments: